Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

29 de junho de 2016

Triunfo do Amor Português




Aqui se dá conta de relações amorosas da nossa História, como Dom Pedro I e Inês de Castro, Leonor Teles e João Fernandes Andeiro, ou a Severa e o Conde de Marialva. A escrita possui alto nível de erudição, como será habitual em Mário Cláudio. Digo “será” porque foi o primeiro livro que li deste autor. Atendendo, porém, aos prémios que já ganhou e ao estatuto atingido no nosso meio literário, não há margem para dúvidas de que a sua escrita vale por si mesma.

As ligações amorosas são tratadas de um ponto de vista inabitual, dando ênfase, por exemplo, à decadência da corte e dos mosteiros no século XVIII, no caso entre Dom João V e Madre Paula, com aspetos mesmo grotescos, que se escondiam atrás dos luxos. No episódio envolvendo a Severa e o Conde de Marialva, o ênfase vai para a promiscuidade e a miséria de certos meios. Surpreendeu-me a ternura posta no descrever da paixão de Mariana Alcoforado pelo Conde de Chamilly e o meu episódio preferido foi o de Camilo Castelo Branco e Ana Plácido. Mário Cláudio é exímio no retratar do narcisismo dos escritores, um narcisismo ligado à febre da produção literária, que põe todos os outros aspetos da sua vida na sombra. No caso de Camilo Castelo Branco, e devido à época em que viveu, essa fixação no próprio ego alia-se ao machismo, uma mistura fatal para a igualmente culta Ana Plácido. Fiquei, no entanto, desiludida com o capítulo dedicado a Dom Pedro I e Inês de Castro. Apesar de Mário Cláudio fugir à descrição comum deste romance, não foi tão longe quanto eu desejaria, mantendo alguns mitos.

Uma escrita que vale por si mesma, porém, sendo inimitável na sua erudição e dando um estatuto único, por demais merecido, ao seu autor, torna-se ela própria narcísica, ou seja, vive por si e para si, esquecendo-se, por vezes, da sua função de veículo de um enredo e de personagens. Torna-se assim fastidiosa a leitura de certas passagens.


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