Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

31 de março de 2015

O Cavalheiro Inglês




De Carla M. Soares já li o suficiente para saber que tem uma imaginação inesgotável, expressa em enredos empolgantes, cheios de surpresas. E se, num romance deste tipo, há sempre uma certa dose de previsibilidade, a autora consegue salpicá-la com uma série de viragens inesperadas, que incluem um crime.

Neste “Livro RTP”, deparamos com um Portugal em convulsão, na passagem do século XIX para o XX, com a contestação à monarquia a subir de tom, sendo o ideal republicano defendido por grupos mais ou menos violentos. A nobreza agoniza, famílias outrora ricas e influentes perdem a supremacia e o património, também devido ao Ultimato inglês, surgido na sequência da chamada “partilha de África”, o que originou, no nosso país, grande animosidade em relação aos britânicos.

Sofia, a personagem principal do romance, apaixona-se precisamente por um inglês. Apesar de ainda manter as aparências, a família de Sofia encontra-se irremediavelmente empobrecida e nem o facto de Robert Clarke poder ser a sua salvação o torna bem visto aos seus olhos. Os pais, mais interessados na manutenção dos seus privilégios sociais do que na felicidade da filha, preferem uni-la ao duque de Almoster, um homem bem situado na vida, embora de carácter duvidoso.

Na sua ânsia de agradar à família, Sofia aceita o noivado, mas luta contra a repulsa que o duque lhe inspira. Ao mesmo tempo, luta contra si própria e a sua condição de mulher e menina solteira, mantida afastada das problemáticas políticas e sociais, desejando romper essa redoma onde insistem em enfiá-la. Constata que nem com o irmão pode contar, ele próprio envolvido em conflitos, interiores e não só, já que as suas simpatias republicanas o levam a envolver-se com um grupo anarquista violento.

Como se vê, ingredientes suficientes para uma leitura empolgante, onde nem todos os mistérios são resolvidos ou explicados, nem os heróis se apresentam sem mácula. Esta é também uma característica nos romances de Carla M. Soares: certos conflitos não se resolvem totalmente e há uma certa dualidade nas personagens. Como todos nós, possuem um lado bom e um mau que se digladiam.

Parabéns à Carla por mais um excelente romance!


2 comentários:

Olinda Melo disse...


Gosto de romances salpicados de passagens históricas. O Século XIX é uma época muito interessante na História de Portugal.Vislumbra-se a mudança de regime com o partido republicano já bastante irrequieto. Além disso, a partilha de África decidido na Conferência de Berlim vai ditar a ocupação efectiva desses territórios. Uma partilha feita a régua e esquadro, nos gabinetes, sem qualquer respeito pelos povos (donos da terra) e tradições. Enfim, veremos como a História de Portugal se misturará com a História de África, uma relação muito diferente da do Século XV...

Bj

Olinda

Cristina Torrão disse...

É verdade, Olinda, uma partilha com consequências trágicas, começando logo na 1ª Guerra Mundial e com reflexos até aos nossos dias :(

Enfim, aguardemos por melhores tempos...

Bj