Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

11 de abril de 2013

Divagações Abrilinas (2)




Uma solteirona estava proibida de manter contactos íntimos com homens. Usava-se muito a expressão «meter um homem em casa». Quando a mãe dela falava de uma solteira que «meteu um homem em casa», mirava a filha de lado, num misto de intimidação e desconfiança, como se a miúda, com oito anos, já se pusesse com ideias dessas. Falava-se em «meter um homem em casa» com mais indignação e repulsa do que se falava de um recém-nascido abandonado numa lixeira, ou de um marido que tivesse matado a mulher à pancada.
Ter oito anos, em 1974, implicava não fazer ideia de que existiam relações sexuais. E, por mais voltas que desse à cabeça, ela não alcançava a razão para tanto escândalo à volta da mulher que «metia um homem em casa».
Antes do 25 de Abril, não havia classes mistas, as meninas aprendiam e brincavam separadas dos rapazes. No recreio da escola havia um muro. Saltar para o lado dos rapazes estava, para meninas da primária, ao nível de «meter um homem em casa».



3 comentários:

Bartolomeu disse...

Esta post fêz-me recordar a velhíssima anedota do marido que chega a casa ao fim do dia e comenta com a mulher, olhando-a de soslaio:
-Maria, sabes o que távam agora mêmo a dizer ali na tasca?
-Sei lá home! O qu'era?
-Távam a dizer caqui na rua todas as mulheres metiam homes em casa, menos uma...
-Menos uma??? Ah!!! Essa deve ser a porca da vizinha aqui do lado...

JR disse...

Por acaso na "minha" escola primária isso não acontecia. Era uma escola pequena para uma aldeia pequena e juntava em duas salas as 4 classes da primária, rapazes e raparigas e uma única professora para todos. Depois veio uma segunda e entre si dividiam as classes mas sem separação por sexo.
Já a seguir, no liceu (Portalegre) havia um muro a separar o recreio e também havia a separação das turmas e corredores por onde não poderia haver misturas.
Se a junção que depois de 74 se deu foi benéfica numa perspectiva social, não me parece que o ensino tivesse objectivamente melhorado nem um bocadinho.
Nesse tempo, como agora, apesar de parecer diferente, o importante é o que se mostra, não o que se é.

Cristina Torrão disse...

Pois é, Bartolomeu, a vizinha do lado é sempre a pior :)

Sim, João, já ouvi outras pessoas dizerem que, em aldeias pequenas, se juntavam as crianças. Mas eu vivi uma realidade bem diferente e que me metia muita confusão, já que passei a minha infância a brincar com o meu irmão e o meu primo, que era vizinho. Mas a brincadeira com rapazes que não pertencessem à família estava-me completamente proibida! Eu nem me podia aproximar deles, acredite!!! E como é que uma criança, dos 4 aos 9 anos, consegue entender isso? Eu não entendia.
Apesar de ter feito a 4ª classe depois da revolução, fui mantida na turma de meninas. Iniciei o ciclo preparatório no ano letivo de 75/76 e ainda me lembro da minha agitação, no primeiro dia, por ir pertencer a uma turma mista! Aliado a algo que ninguém me soube (nem se deu ao trabalho de) explicar: porque é que, de repente, já podia brincar com rapazes?

Quanto à qualidade do ensino, isso já é outra coisa, sim...